A ignorância é Felicidade! Frase aparentemente inocente e despretensiosa, mas que está cheia de significados e implicações filosóficas. Ela aparece no filme Matrix, numa importante discussão acerca da verdade. Parece supor alguém que conhece os dois lados da moeda: a ignorância e o conhecimento. Alguém que trilhou caminhos bem definidos para alcançar o alvo-conhecimento e, agora, olhando para trás, chega à conclusão que era mais feliz no tempo da ignorância. “Melhor tivesse ficado sem conhecer a verdade, na ignorância”, chega-se a afirmar. De fato, conhecer, muitas vezes, é atormentador.
Paulo, Apóstolo de Jesus Cristo, sentiu na pele o peso que o conhecimento trás ao homem. Diz ele: “eu não teria conhecido o pecado, senão por intermédio da lei; pois não teria eu conhecido a cobiça, se a lei não dissera: Não cobiçarás” (Romanos 7:7).
Numa elucubração anacrônica, imaginemos Paulo assistindo Matrix. Será que ele concordaria com a célebre frase “Ignorância é felicidade”?
A.W.Pink comentando essa luta interior que o apóstolo Paulo travava com sua própria consciência-conhecedora, faz a seguinte afirmação:
O reconhecimento dessa guerra em seu íntimo e o fato de que se tornou cativo ao pecado levam o crente a exclamar: “Desventurado homem que sou!” Esse é um clamor produzido por uma profunda compreensão da habitação do pecado. É a confissão de alguém que reconhece não haver bem algum em seu homem natural. É o lamento melancólico de alguém que descobriu (grifo meu) algo a respeito da horrível profundeza de iniqüidade que existe em seu próprio coração. É o gemido de uma pessoa iluminada por Deus, uma pessoa que odeia a si mesma — ou seja, o homem natural — e anela por libertação(http://www.editorafiel.com.br/artigos_detalhes.php?id=84).
Eis o tormento causado pelo conhecimento, inclusive da Lei Moral de Deus. Acaso não teria sido mais vantajoso ter continuado na ignorância em relação à Lei? Muito tarde para isso. Não dá mais para “não ter conhecido”. Uma vez iluminados pela luz da verdade, não conseguiríamos viver novamente na escuridão da ignorância; por mais difícil que seja conviver com o conhecimento. E se pudéssemos aconselhar o ignorante? Diríamos para continuar na sua ignorância para não se arrepender de ter conhecido? Estaríamos corretos?
O Filósofo Grego Platão, em sua Alegoria da Caverna, abordada a partir da Teoria do Conhecimento, ensina que a vida do ser humano pode ser divida em 3 etapas:
1º) A primeira etapa, a Agnosis, é a etapa da Ignorância, representada, em sua alegoria, por homens presos, desde a infância, no interior de uma caverna escura, olhando sombras refletidas na parede, enquanto entendem ser esta a única realidade/verdade existente, já que não conheciam outra. Segundo Platão, todos os seres humanos, sem exceção, já nascem nessa etapa, na ignorância. A maior parte das pessoas jamais sairão dela. Nascerão, viverão e morrerão na ignorância.
2ª) A segunda etapa, o Doxa, é a etapa da desconfiança ou opinião, representada na alegoria, pelo prisioneiro que consegue se libertar e olhar, pela primeira vez em sua vida, em outra direção, para a entrada da caverna, quando percebe que existe algo além das sombras que entendia como a única verdade existente, porém, ainda não consegue discernir com clareza o que consegue ver no exterior da caverna, mas tem, agora, certeza de uma coisa: existe algo além das sombras que via. Segundo Platão, algumas pessoas transcendem à Agnose e conseguem chegar a essa etapa, mas não todas.
3ª) Finalmente, a terceira etapa, Episteme, é a etapa do “Conhecimento”. Quando o indivíduo que conseguiu se libertar de sua cadeia, imposta desde a infância, e, agora, sai definitivamente da caverna, ficando frente a frente com o real, com a verdade. Ele finalmente, “conhece” a verdade e entende perfeitamente que antes, quando na caverna, era um ignorante, vendo sombras e julgando ser a realidade. Segundo Platão, poucos chegam nessa etapa.
A imagem acima, em forma e significado piramidal, demonstra bem o número de pessoas em cada uma dessas etapas:
Ao se deparar com a Luz da verdade, do conhecimento, identificados na alegoria de Platão pela Luz do sol, o preso que consegue se libertar das cadeias, já começa a sentir os primeiros problemas causados pelo “conhecimento”:
1) Seus olhos, agora desconfortáveis, são ofuscados por conta dos longos anos vividos na escuridão da caverna;
2) Sente a necessidade, incontrolável de voltar à caverna para tentar soltar seus companheiros de infortúnio, pois o conhecimento da verdade não lhe permite mais viver tranquilamente enquanto lembra-se de outras pessoas, seus companheiros, que ainda estão vivendo na completa escuridão da ignorância, o que denota a inquietação e responsabilidade trazida pelo conhecimento;
3) Sofre muita resistência dos seus antigos companheiros de prisão ao tentar abrir-lhe os olhos para que, também, assim como ele, conheçam a verdade. Afinal, é bem mais cômodo ficar na zona de conforto que sair em busca do conhecimento.
4) Como insiste em levar o conhecimento adquirido adiante, aos outros, é, finalmente, morto por seus próprios companheiros. De fato, muitas vezes o conhecimento poderá ser responsável por traumas irremediáveis.
A decisão por querer conhecer é algo de extrema responsabilidade e que trás um imenso peso ao ser humano. Chegar ao conhecimento, entretanto, não é nada fácil. Por isso mesmo, muitas pessoas preferem continuar na comodidade e na inércia da ignorância. É preciso percorrer um longo e árduo caminho para chegar ao conhecimento.
O filme Show de Truman aborda de forma brilhante esse tema, completamente embasado na Teoria do Conhecimento de Platão. Ou seja, alguém que vivia na completa escuridão da ignorância e depois resolve sair em busca da verdade, do conhecimento.
Apesar do tormento que o “conhecimento” pode trazer, ele é também fonte, talvez a única, de soluções inadiáveis. O conhecimento prévio de uma doença grave, por exemplo, ainda que traga dor e tristeza, pode ser fundamental para o início de um tratamento eficaz. Da mesma forma, o conhecimento do perigo que um filho está correndo, por mais desesperador que seja para seus pais, pode permitir que cheguem a tempo de salvá-lo do desastre eminente.
Finalmente, o que a bíblia tem a nos dizer sobre esse tema?
Qual a recomendação e opinião da Palavra de Deus a esse respeito? Devemos buscar o conhecimento ou, antes, pelo contrário, preferir a ignorância? Qual o melhor para nossa vida? O atormentador peso do conhecimento ou a suposta leveza da ignorância?
Que muitos líderes religiosos preferem seus rebanhos na mais completa escuridão e ignorância, para poder assaltar-lhes os bolsos com maior tranqüilidade, é certo. Mas, e a Bíblia? O que nos diz? Vejamos alguns textos:
Mateus 28:19-20: “19.Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; 20.ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século”.
Algumas pessoas costumam dizer que não gostam de teologia. “Meu negócio é vida prática”, afirmam. No texto acima, um dos mais conhecidos, sempre que é citado, pontua-se a questão do “Ide” (v.19), da “evangelização”. Mas, não podemos esquecer que o mesmo imperativo para “evangelizar” é aplicado, com a mesma intensidade, para a necessidade do “ ensino da palavra de Deus” (v.20). Em Mateus 22:29, Jesus levanta mais uma vez a questão da importância do aprofundamento no estudo das escrituras. Diz ele: “Errais, não conhecendo as Escrituras”. Em João 5:39, sobre esse assunto, mais uma vez Jesus incentiva o aprofundamento nas escrituras, diz ele: “Examinai as escrituras”.
8.36 Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres.
8.32 e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.(Conhecimento da Verdade)
E o que é a verdade?
Jesus, em João 17:17, explica: “ Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade”.
O próprio Paulo, mesmo sabedor do sofrimento e responsabilidade que o conhecimento trás, opta por ele e desconsidera a possibilidade de viver na ignorância. Muito embora, o conhecimento de Deus e dos seus preceitos também produzam prazer e descanso sem igual.
II Timóteo:
Colossenses
1.10 a fim de viverdes de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado, frutificando em toda boa obra e crescendo no pleno conhecimento de Deus;
Romanos
1.28 E, por haverem desprezado o conhecimento de Deus, o próprio Deus os entregou a uma disposição mental reprovável, para praticarem coisas inconvenientes,
Por fim, devemos entender que o conhecimento de Deus e de seus preceitos, descritos exclusivamente em sua Palavra, são verdadeiros luzeiros a iluminar nosso caminho, a dissipar por completo as trevas da ignorância.
Tito
1.1 Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus Cristo, para promover a fé que é dos eleitos de Deus e o pleno conhecimento da verdade segundo a piedade.
Por fim, devemos entender que o conhecimento de Deus e de seus preceitos, descritos exclusivamente em sua Palavra, são verdadeiros luzeiros a iluminar nosso caminho, a dissipar por completo as trevas da ignorância.
A ignorância é Felicidade?
Depende do que entendemos por Felicidade. Depende do objetivo de nossas vidas. Se nosso objetivo é a glória de Deus, não podemos ficar alheios ao conhecimento Dele e de seus preceitos. Se há alguma possibilidade da ignorância trazer felicidade, prefiro, e devemos preferir, a dor do conhecimento à louca sensação de paz e tranqüilidade que a ignorância forja, fazendo tudo parecer real, enquanto sabemos: são apenas sombras.
Preferir sombras à verdade, tendo a possibilidade de conhecer a verdade, é um ato tão louco quanto pode ser.
Preferir sombras à verdade, tendo a possibilidade de conhecer a verdade, é um ato tão louco quanto pode ser.
Lâmpada para os meus pés é a tua palavra e, luz para os meus caminhos (Salmos 119.105).
Via: http://filosofiacalvinista.blogspot.com.br/2012/05/ignorancia-e-felicidade.html
Tags:
Filosofia